domingo, 28 de setembro de 2008

Eu, um pop star em Haselünne

Não tem coisa melhor do que sair no jornal. Você anda na rua e as pessoas te olham, então você estufa o peito, orgulhoso. Pode ser que elas não tenham lido a matéria e nem saibam quem você é, mas não importa. É o seu dia!

Pois hoje aconteceu isso comigo. Saiu uma matéria sobre mim, escrita pelo jornalista Manfred Fickers, no jornal Meppener Tagespost.



É que há um programa para pessoas que querem arriscar a vida fazendo testes com equipamentos perigosos. Normalmente, os testes são feitos por estrangeiros, porque a vida deles não vale muito aqui. Topei participar e estou aí na foto, bonito, voando pelo céu.

***

Bem, a verdade agora. Saí no meio do jornal, na seção Locais.


Como sei que a maior parte dos meus amigos e familiares não entende alemão, traduzo a matéria. Diz assim:

Mulheres fora de si por causa de brasileiro

Jornalista não perdoa e pega todas na Alemanha

Loiro, baixo, bonito e sensual, o jornalista Augusto Machado Paim não veio do Brasil para perder tempo. Desde que chegou em Haselünne, tem passado o rodo nas mais lindas divas do nosso país. "No Brasil eu não tinha todo esse mel, aqui me sinto em casa", diz. O jovem é um frisson entre as mulheres da cidade, que gritam histéricas, como se ele fosse um John Travolta das antigas. Com muito bom-humor, ele topou fazer esta foto, imitando o famoso passo de dança do filme Embalos de Sábado à Noite.

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Ok, ok, brincadeira. O texto verdadeiro é este:

Um pouco de futebol arte do Brasil

Jogar futebol é fácil para brasileiro

Augusto Machado Paim, jornalista, 22 anos, é o verdadeiro craque. Não é à toa que veio do Brasil. Semana passada, por exemplo, em um dos treinos, fez dois gols e deu um passe de letra que deixou o companheiro de time sozinho contra o goleiro adversário. O infeliz, porém, não é brasileiro e chutou para fora. "É necessário e oportuno dizer que nem todos os homens no Brasil tem o dom do futebol. Seja sorte na evolução do tronco familiar, seja inspiração divina, tenho que agradecer por poder mostrar aqui toda minha habilidade", diz Augusto, que surpreende também no discurso, tão diferente do bê-a-bá de sempre das entrevistas futebolísticas. Especialistas no esporte dizem que se o jovem tivesse investido na carreira de jogador ele poderia ser melhor que Diego, ídolo do time do Bremmen, ou mesmo disputar com Ronaldinho Gaúcho a bola de ouro da Fifa. A disputa seria acirrada e justa, pois os dois nasceram na mesma cidade.

***

Tá bom, dessa vez não minto mais.Traduzo o texto, aumentando um pouco aqui, reduzindo um pouco ali, em função da tradução. Qualquer erro é desculpado por se tratar de uma reportagem em alemão. E ah, sim, o jornalista também me entrevistou em alemão, diga-se de passagem, então as informações não são beeeem precisas. Em todo caso, me senti refletido na matéria, o principal sobre mim está ali. Algumas observações e correções ponho como notas ao fim do texto. Bem, lá vai:

Idéias de Emsland (1) para o Brasil 

Jornalista faz comparações

Não só para aprender alemão veio para Haselünne o brasileiro Augusto Machado Paim, que participa do programa de Aupair e fica aqui por um ano. O jornalista quer fazer comparações entre os dois países para o webjornal de um instituto cultural (2).

Ele tem 22 anos, concluiu a faculdade no ano passado, trabalhou depois para um instituto cultural em São Paulo (3), cidade de milhões de habitantes, e estudou alemão dois anos e meio no Goethe-Institut de lá (4). “Muitas pessoas no sul do Brasil têm ascendência alemã“, diz Machado Paim. Ele é natural do estado do Rio Grande do Sul, fronteira com a Argentina.

O foco do seu trabalho é a cultura, mas no jornal na internet outros campos são trabalhados, como a vida social. Machado Paim se propôs a pesquisar esses temas em Emslamd a partir do próximo mês e então dar sua contribuição.

Lixo e pobreza

Um dos temas é a economia do lixo. No Brasil existem mais depósitos de resíduos e pessoas que assustadoramente fazem seu sustento a partir deles. O jornalista tem observado nosso sistema altamente técnico, que evita ao máximo a poluição ao meio ambiente. Existem muitas perguntas que ele procura resposta. Sua meta é apresentar para discussão no Brasil essas soluções que existem em Emsland.

Outro tema é a pobreza. Em função de um trabalho, Machado Paim esteve apurando em favelas no Rio de Janeiro (5). A família com quem ele mora em Haselünne tem dois irmãos que tal como foram adotados de uma favela (6). Aqui o jornalista aprende como funciona uma adoção internacional no Brasil e na Alemanha.

Uma grande diferença o jornalista já notou. “No Brasill, os problemas sociais são vistos na maior parte da população.“ A rede de trabalho pública e estatal, que ajuda pessoas em situação de calamidade na Alemanha, impressiona-o. Por quê, porém, também no nosso país existem pessoas pobres, é uma outra pergunta, que ele quer descobrir a resposta.

Legenda da foto: Augusto mostra sua terra natal no mapa-múndi (7).

Notas:
(1) região da Alemanha onde circula o jornal.
(2) o Manfred se refere ao site da revista Continuum, do Itaú Cultural, para o qual faço alguns trabalhos, e ao FIZ TV, webtv da Abril, de cujo programa de jornalismo chamado Fiz + Sotaques participo com jornalistas de outros estados. Acho que ele misturou os dois projetos numa coisa só.
(3) novamente uma citação ao Itaú Cultural, para o qual faço freelas de vez em quando, sem vínculo empregatício. Quer dizer, nunca morei em São Paulo.
(4) estudei no Goethe de Porto Alegre.
(5) posei uma noite no complexo de favelas da Maré e passei uma tarde no morro do Vidigal, em setembro de 2007.
(6) Iládio e Benedito viviam num abrigo em Fortaleza. A mãe biológica mora num favela. Em breve conto melhor a história da família com quem estou aqui em Haselünne.
(7) a legenda especifica ainda onde fica esse grande mapa-múndi, mas isso é difícil de explicar e pouco importante de saber. Basta dizer que estão construindo um parque de diversões no local.

***

Última observação: relendo a matéria traduzida, vi que ela parece ser escrita por um alemão falando português. Pois eu, um brasileiro traduzindo do alemão, produzo o mesmo efeito, se traduzo palavra por palavra. Daí que optei por adaptar algumas partes do texto a como ele seria escrito se o autor fosse brasileiro. Claro que muitos sentidos se perdem, principalmente porque eu não tenho domínio pleno do idioma e não entendo tudo. Em todo caso, traduzir acarreta nesse monte de questões mesmo, não importa o idioma.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Cultura milenar


Faz tempo que procuro nessa foto alguma informação visual que diga que ela não foi tirada há cinco ou mais séculos. Por favor, se você encontrar, me avise. Até as casas e as ruas remetem ao passado. Acredito que apenas pelo fato de ser uma foto sabemos que é atual. Quer dizer, a fotografia, enquanto técnica e arte, não é tão antiga assim.

Tirei a foto há uns dez dias, durante uma bonita festa que ocorreu aqui em Haselünne.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Saudade do Mike!

Uma homenagem ao meu amigo Mike, que tem feito muita falta por aqui:



Esse pub fica na cidade de Meppen, bem pertinho de Haselünne, onde estou morando. Mas não se sinta o máximo, Mike, porque eu também sou uma marca por aqui. Olha:


Eu sei, meu nome aparece no lixo, mas Augustin é uma empresa bem famosa. Trabalha com quase todo o processo de triagem, recolhimento e reciclagem na região. Já está valendo, portanto!

E também tenho meu nome num barco.

sábado, 20 de setembro de 2008

O misterioso caso dos ladrões do lixo, o automatismo das coisas e outros causos e observações sem muita relevância

Sempre há muita coisa para dizer, e normalmente esqueço, principalmente agora que uso internet só 2 ou 3 vezes por semana, em lan house. A partir de janeiro talvez tenha internet em casa, então escreverei mais vezes neste blog.

Agora, porém, faço uma tentativa de registrar num único post boa parte das observações, histórias e peculiaridades que vi e vivi até agora.

As casas e os jardins
Quando cheguei na Alemanha, me pareceu que todas as casas eram quase iguais. Comentei isso com a Christine, minha anfitriã. Ela disse que não, não eram todas iguais. Argumentei que o estilo é o mesmo em quase todas elas: tijolos a vista, dois ou três andares, com jardins bem cuidados.


Depois a Christine me explicou que, alguns anos atrás, havia uma lei regulamentando que aparência as casas deveriam ter, um projeto ligado ao paisagismo urbano. Alguém se deu conta porém que era uma bobagem o Estado gerir os gostos das pessoas, e essa lei não existe mais. Por isso já há algumas casas amarelas, por exemplo.



Vale ainda dizer que é impressionante que quase todas as casas, praticamente sem exceção, têm um belo jardim na frente. Parece que há uma preocupação muito grande com isso.


No Brasil, essa não é a norma. Enquanto uma casa pode ter uma frente linda, outra pode ser só grama, e outra um matagal.

Gato consciente
Acredite se quiser, esses dias eu andava pela cidade, quando vi um gato atravessando a rua. Aparentemente um fato banal, como eu mesmo pensei na hora. De repente, porém, me dei conta que ele atravessava na faixa de segurança.

Onde estava a máquina fotográfica nessa hora? Naturalmente, em casa. Até pensei em montar uma foto mais tarde, com um gato qualquer, mas não seria a mesma coisa. Perdi uma baita foto.

O automatismo das coisas
Uma das primeiras observações que fiz quando cheguei na Alemanha é que há muito mais automatismo na vida cotidiana, nos afazeres domésticos. Quase todas as casas têm, por exemplo, uma máquina de lavar louça, e os apetrechos para usar no aparelho são vendidos em todos os supermercados em abundância. Dentro de casa, tudo é mais fácil de fazer. O esfregão pra limpar o chão tem um mecanismo (não-eletrônico) em que você pisa e o pano está solto, não há necessidade de se abaixar. A cafeteira da casa da Christine funciona com uns envelopes prontos, na medida certa para uma ou duas xícaras, que você só põe na máquina, liga, escolhe a quantidade e espera (isso não existe, porém, em todas as casas).

Cortar grama aqui é de uma facilidade absurda. Mesmo na casa da Christine, com um jardim gigante e uma máquina velha. A grama cai dentro dum saco e você leva com um carrinho de mão para jogar fora. E existem máquinas novas bem melhores, em que você até corta a grama sentado.

Nos supermercados, há máquinas para coletar garrafas plásticas. Você põe ali no buraco, um laser reconhe e puxa. Se é de material diferente do que se coleta, a máquina devolve. Ao fim, você aperta o botão e recebe ¢ 0,25 por garrafa para usar em compras.

A maioria dos aparelhos eletrônicos que se usam aqui existem também no Brasil. A diferença é que na Alemanha quase todo mundo tem, ao passo que, no Brasil, só uns poucos privilegiados. E não que se trabalhe menos aqui não, muito pelo contrário. Apenas o trabalho é otimizado e se faz muito mais coisa em menos tempo.

Kaputtes Auto
Indo jogar a grama fora, encontrei este carro abandonado no meio do matagal:


Fiz questão de fotografar porque, além de uma ótima composição, as imagens sucintam várias perguntas. Como o carro foi parar aí? A quem pertencia? Há quanto tempo está abandonado? O que aconteceu com as pessoas que estavam nele? Sem falar nas metáforas e oposições, tipo produto humano x natureza.

E por aí vai…

Sem vitrines
Uma das coisas mais curiosos da região onde moro agora e, portanto, também da cidade de Haselünne, é que por trás de uma porta qualquer na rua, pela qual você não dava nada, pode existir um supermercado, uma biblioteca ou um restaurante. Bem assim: está escrito apenas o nome e o tipo de estabelecimento na porta, então você entra e, SUPRESA!, o lugar é grande, aconchegante, bem cuidado.

Praticamente todo dia descubro um lugar diferente desse mesmo jeito aqui em Haselünne. A última surpresa foi uma loja de departamentos, no sábado. O detalhe é que a loja é enorme, não dá pra entender como há lugares assim numa cidade de só 13 mil habitantes. Loja do mesmo tamanho só há em grandes cidades no Brasil.

Esses dias me dei conta que uma explicação para esse estranhamento pode ser a ausência de vitrines ou, na maioria das vezes, um vitrine pequena. Ou seja, antes de entrar, não vemos bem o que tem dentro do lugar. Daí a surpresa. E por que as vitrines são assim, quando existem? Taí algo que ainda preciso descobrir. Mas me dei conta agora que também quase não existe publicidade nas ruas por aqui. Deve haver uma lei regulamentando tudo isso.



Verein
Existe na Alemanha algo fácil de entender (se você está aqui), mas difícil de explicar. Chama-se Verein. É tipo um clube, onde amigos se juntam para praticar determinada atividade física ou cultural. Praticamente não existe possibilidade de praticar esportes fora desses lugares, essa é uma diferença fundamental em relação ao Brasil.

Vou pegar como exemplo a Sport Verein Eltern, onde treino futebol. Tem dois campos de futebol 11, onde treinam gente de todas as idades, em horários diferente para cada faixa etária. Depois do treino, os adultos bebem cerveja e fumam, se fumante são. Se não, só aspiram a fumaça.

São normalmente dois treinos e um jogo por semana. Sim, pois há campeonatos regulares entre as Verein, tudo muito bem organizado.


No Brasil, eu só teria oportunidade de jogar futebol de campo se eu tivesse mais 21 amigos com a mesma vontade de jogar que eu ou se eu quisesse ser jogador. Se você não é mais adolescente, é muito difícil treinar por treinar, os clubes de futebol são chamados de Escolinhas porque você está lá sempre para aprender algo. Então, se você passou da idade, você faz assim: convida mais um par de amigos, reserva uma quadra, e joga salão ou sete, variando o grau de dificuldade e estresse pra quem está organizando tudo e precisa ligar pra todo mundo e lidar com os pepinos de última hora, como o cara que não vai mais jogar e não avisa. Enfim, se há uma turma fixa, é possível jogar sempre, com regularidade, mas isso não é muito comum. Aqui é o contrário, já está tudo organizado. Você só vai lá e treina. No fim, bebe cerveja, como no Brasil.

Sendo hostil sem querer
É possível ser antipático na Alemanha sem o saber. Pois a Christine me contou outro dia que não é muito amigável ficar de jaqueta dentro da casa de outra pessoa, quando se é visita. Você deve estar se fazendo agora as mesmas perguntas que eu me fiz quando ela me falou isso. Eu estava com uma jaqueta jeans na hora.

Uma explicação que bolei é esta: quase todas as casas aqui tem um sistema de aquecimento interno (sim, porque aquecer o lado de fora da casa daria muito trabalho), então você não passa frio. Se você permanece de jaqueta dentro de casa, mesmo que jeans, é como se você dissesse que o aparelho não está funcionando direito.

Pensando bem, não procede. A Christine disse que dá para vestir um pulôver dentro da casa de outra pessoa. Agora, por que um pulôver, e uma jaqueta não? Vai entender.

A tevê
Paira um mistério sobre o modo como funcionam as redes de televisão na Alemanha, um mistério que a Christine, quando tiver um tempinho, ainda vai me explicar. Há muitos canais, muitos mesmos e, pelo que sei, não temos tevê a cabo em casa. O interessante a dizer por hora é que tevê é tevê, praticamente em todo lugar. Quer dizer, aqui tem tantos programas bobos quanto no Brasil. Tem um tipo Márcia Goldschmitt, por exemplo, em que se faz teste de dna quando a paternidade de uma criança é duvidosa.

Tem um outro canal em que à noite passa um programa de adivinhações bem tosco. O telespectador liga e, se acertar, ganha um prêmio em dinheiro. O detalhe é que a moça que apresenta fica com um short minúsculo e as tetas de fora. Apesar da apelação, ontem senti pena da guria. Ela repetia a todo momento que o prêmio havia sido dobrado, que cada ligação dava direito a duas respostas e, se se acertasse as duas, o pagamento seria de dez mil euros. E ela repetia sempre que atenderia somente mais cinco ligações. E repetia mais. E mais. Por quê? Porque ninguém estava ligando. Nunca vi disso. Se fosse no Brasil, choveriam ligações.

Ler faz bem
Desde a primeira semana na Alemanha, leio histórias para as crianças antes de dormir. Em alemão, claro. No início, eu lia um pouco e perguntava: vocês estão entendendo? Iládio, Benedito e Saboor respondiam que sim. E mais, me disseram que eu leio bem em alemão. Fiquei feliz, mas principalmente por que eles entendiam. Pensei: que bom, porque eu não entendo nada do que leio.

É uma situação muito estranha e nova. A Christine disse que com ela acontece o mesmo, ela consegue ler textos em português para outra pessoa, mas não entende o que está lendo. Com o tempo, a gente vai pegando uma ou outra palavra. Ajuda também o fato de eu ler geralmente Märchen, ou seja, contos de fada, que têm uma linguagem mais simples (e são histórias encantadoras, diga-se de passagem). Também tenho lido para mim mesmo o livro Grimms Fairy Tales, então procuro ler mais tarde para as crianças em alemão a mesma história que li em inglês, o que ajuda um pouco.


Outra situação curiosa é estar num lugar onde todo mundo conversa e você não entende absolutamente nada. Comigo, isso acontece após o treino de futebol, quando o povo senta para beber e fumar. Nos outros lugares costumo entender bem as conversas, ou ao menos o essencial. No treino, se eu entendo uma palavra já é uma vitória. Outro dia consegui entender o trecho duma conversa, me senti o máximo. De vez em quando consigo diferenciar o nome duma pessoa de uma palavra qualquer, também. Que tal!

O misterioso caso dos ladrões do lixo
Num final de semana desses, eu e a Christine fomos a um depósito de lixo jogar fora aparelhos eletrônicos velhos. Os depósitos aqui nem de longe lembram os do Brasil. São lugares para triagem de material, reciclagem, sem mal-cheiro e sem seres estranhos. Pois chegamos lá, estava fechado. Ainda lamentávamos o fato quando, por entre a grade, vimos um cara correr e se esconder lá dentro. Talvez mais de um.

A Christine ficou encucada. Uma semana antes eu tinha visto a mesma coisa com o jornalista Manfred. Estávamos em um outro depósito, também fechado, e gente saiu correndo. Ele ficou surpreso, mas não deu muita bola. Já a Christine ligou para a polícia.

Enquanto esperávamos, paramos o carro num lugar mais afastado, escondido. A rua onde fica o depósito não tem saída, portanto veríamos quando os supostos ladrões fossem embora. Cerca de 20 minutos depois, uma kombi verde surgiu na direção contrária, indo ao depósito. Anotamos a placa. Certamente os homens estavam roubando metal, que vale bastante aqui, e a kombi vinha buscar o material. Depois veio outro carro, que voltou bem rápido: era um motorista inocente, que nem nós, que apenas queria deixar algo no depósito. Deve ter se assustado quando viu gente lá.

A seguir, a kombi foi embora, só com o motorista. Achamos que os ladrões deviam estar abaixado lá dentro, caso contrário ainda estariam no depósito. Não quisemos voltar para ver. Ainda esperávamos os policiais, quando outro carro veio. O motorista tinha o rosto encoberto por um boné e óculos escuros, claramente procurando não ser reconhecido. Havia mais gente no carro, e a Christine dizia que eram poloneses, pelo tipo físico. Eu fiquei quieto, não entendo nada disso.

Acho que uma hora depois da primeira ligação da Christine para a polícia, enfim os policiais chegaram. Por uma questão de sorte ou azar, dependendo do ponto de vista, chegaram quase junto com o carro de poloneses, que certamente vinha buscar os comparsas. A Christine falou com os policiais, deu-lhes número de placa e outras informações, e então fomos embora para casa, embora estivéssemos curiosos para saber se era tudo imaginação nossa ou era mesmo verdade.

Dias mais tarde, soubemos que a polícia prendeu duas pessoas depois que saímos. Ajudamos a resolver o caso.

domingo, 14 de setembro de 2008

Escócia

Não conheço a Escócia ainda, mas tive a oportunidade de ver um cara tocando fole ontem, numa bonita festa que fechou o centro de Haselünne. Veja:

sábado, 13 de setembro de 2008

Zoo, lógico!

Olhe estas fotos:


São do zoológico de Osnabrück.

Todos os anos, os pais da Christine dão um presente surpresa de Natal aos filhos e netos. No ultimo 25 de dezembro, nada aconteceu, então o presente foi dado agora, no dia 31 de agosto. Foram no zoológico os cinco filhos do casal e seus anexos, mais, pelo que contei, uns 14 netos. Ah, sim, e eu, o Aupair, junto.


Foi um dia muito divertido. Apesar de já ter ido infindáveis vezes ao zoológico no Brasil, havia animais lá que eu não conhecia. E na hora do almoço paramos numa pracinha que, na minha avaliação, não tinha brinquedo para crianças. Por exemplo, havia lá uma girafa de madeira de uns 5 metros de altura, senão mais. As crianças subiam por escadas e desciam no tobogã. Achei que era perigoso e, pensando na segurança dos meninos, fui testar. Definitivamente, não era para crianças. Tanto que eu, adulto, desci mais duas vezes.


Também havia no zoológico um monte de espécies diferentes, como por exemplo, uma criança de cabelo moicano:

Animais de pedra:


Cena rara, um animal fora da jaula:


E um primata comendo banana:

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

As problemáticas idiomáticas

Faz um mês que estou na Alemanha. Nesse meio tempo, fiz uma série de reflexões sobre o aprendizado de uma segunda ou terceira lingua, algumas dessas reflexões sem importância alguma no contexto da história geral da humanidade. Notei, por exemplo, que aqui se geme de dor diferentemente de como se geme em português. Diz-se “aua”, em vez de simplesmente “ai”. De início achei que fosse só na casa em que estou, mas não, todo mundo fala assim aqui. Já ouvi “aua” em programas de tevê.

Também são interessantes as fases pelas quais a gente passa na busca de aprender um idioma. Cheguei aqui me virando bem na comunicação básica. Estava satisfeito. Notei que já falava alemão no Brasil, só não tivera oportunidade de usar o idioma até então. As necessidades cotidianas, porém, fazem com que a gente aprenda mais. No início eu praticamente contava quantas palavras novas eu aprendia por dia, apesar de a Christine, minha anfitriã, já ter me dito: “aprende-se alemão com a barriga, não com a cabeça”. Enfim, chega um momento em que dá uma angústia. Todo mundo falando à sua volta e você não entendendo nada. E você sabe que eles estão trocando informações simples.

A minha situação foi piorada pelo fato de eu ter ido em duas peças de teatro em que praticamente nada entendi. A primeira era infantil, ou seja, uma linguagem simples. Eu entendia o que acontecia pelo movimento das personagens em cena, mas não pela fala. Aprendi só duas ou três palavras com essa peça, apesar de ter gostado bastante. A segunda era de humor. O público ria às turras e chegou a pedir bis duas vezes. Fiquei sério quase o tempo inteiro. Eu só ria das expressões dos músicos-atores, que faziam umas imitações em capela muito engraçadas.

Depois chega uma fase que você aprende palavras em campos diferentes da vida cotidiana. Por exemplo: “alemão para cortar grama”. No meu caso, tem também o “alemão para jogar futebol”, “alemão no trânsito”, “alemão de lições de matemática” e o “alemão para fazer judô”. Isso me agrada, ter uma noção mais ampla, em vários aspectos da lingua. Por outro lado, estava sendo difícil para mim guardar todas as palavras novas que aprendia. Tem umas que se pensa que nunca mais vai ouvir, como por exemplo a que aprendi durante o teste de auto-escola: “Vorfahrt”. Esse exemplo é bom, porque ouvi a palavra, mas não sabia como escrever. Pois bem, outro dia li essa palavra num jornal e não esqueci mais. Está aprendida. Ah, sim, “Vorfahrt” quer dizer “preferência, prioridade”.

Enfim, há certa altura eu estava conseguindo me virar muito bem para falar, quer dizer, conseguindo expressar tudo que eu queria (claro que eu não estava querendo expressar muito, não sou exibido), mas não entendendo nada do que falavam, tampouco do que eu via na tevê ou escutava no rádio. Absolutamente nada. Eu inclusive gostaria de ter um gravador para registrar todas essas primeiras conversas e, daqui um ano, descobrir surpreso (ou entediado) sobre o que se tratavam.

Há duas semanas, num sábado, passei a tarde com o jornalista Manfred Fickers, que trabalha no jornal Meppener Tagespost. O Manfred é amigo da Christine e me levou para conhecer alguns lugares bacanas nos arredores, como um museu de barcos antigos e centros de reciclagem na Alemanha. Ele também estava escrevendo uma matéria sobre mim, sou um animal exótico aqui. Quando for publicada, linco neste blog. Por ora, olhe as fotos que tirei.



Pois nessa tarde eu não entendi absolutamente nada do que o Manfred dizia. Foi terrível, eu tentava achar uma palavra conhecida no meio da frase dele pra voltar ao assunto, mas não dava tempo, logo me perdia de novo. Ruim pra mim e ruim pra ele. Cheguei em casa morrendo de dor de cabeça e desiludido com a possibilidade de aprender alemão de fato um dia. Acho que isso aconteceu porque foi uma conversa entre dois jornalistas, ou seja, ele falava coisas ligadas à profissão, um vocabulário que ainda não tenho muito contato.

Curiosamente, na última sexta-feira, percebi que começo a entender muito mais a comunicação das ruas, o que as pessoas falam entre si na cidade. E dentro de casa, então, noto que já falo sem pensar, converso como um alemão conversa. Bem diferente dos primeiros dias, em que eu acordava e pensava: “bah, agora tenho que falar em outra língua”. Hoje já termino o sonho sonhando em alemão.

O primeiro dia que usei internet aqui quase pifou de vez meu cérebro. Ele estava acostumado a quase pensar em alemão, daí eu comecei a falar em português com meus amigos na internet e, duas horas depois, eu simplesmente tinha esquecido como dizer coisas simples em alemão. Deu tiuti. Hoje a mudança de idioma é fácil e rápida. Essa é outra habilidade que se adquire quando se avança no aprendizado de outro idioma.

Resumindo, me parece que agora consigo entender mais, compreender mais palavras (e cada nova palavra ajuda a entender muitas outras ligadas a ela) quando falam comigo ou quando assisto à uma conversa, principalmente quando sei o assunto. Na última sexta-feira, por exemplo, fomos no hospital conversar com o médico do Saboor. Eu entendi todas as instruções que ele deu, pois sei bem agora o tratamento que Saboor faz. Também tenho conseguido ler melhor alguns textos, seja jornal, seja livro de quadrinhos. As imagens ajudam muito nessa fase.

E esses dias aconteceu algo estranho. Aluguei o filme “Before the sunrise”, no Brasil chamado de “Antes do Amanhecer”. É um filme belíssimo, recomendo a todos assistirem, inclusive a sequência, chamada “Antes do Pôr-do-sol”. Pois bem, eu queria treinar meu inglês , então pus o idioma e a legenda em inglês. Começou o filme, e um casal estava discutindo em alemão num trem. Dei pause, procurei arrumar as configurações, mas estava tudo certo. “Scheisse”, disse pra mim mesmo (um palavrão), “este dvd não funciona direito, não vou entender nada.” Eu estava compreendendo boa parte do conteúdo da discussão do casal, mas sabia que não agüentaria o filme inteiro. Dois minutos depois, os verdadeiros protagonistas entraram em cena, falando em inglês. Quando percebi o que aconteceu, ri. Quer dizer, a fala em alemão era para não ser entendida (e me parece bem lógica a escolha do roteirista: alemão é uma lingua pra não ser entendida mesmo). E eu compreendi quase tudo!

Em todo caso, quando algo me dói ainda não digo “aua”.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Depois da travessia de limiar, testes e recompensas

Na sexta-feira, 15 de agosto, Iládio e Benedito chegaram da excursão. Eu, Christine e Saboor, que já havia recebido alta do hospital, fomos buscá-los no ônibus. De início, Iládio e Benedito nem deram bola para mim. Depois, também não. Eu era o terceiro Aupair da família, nenhuma novidade.

Fomos para casa, e lá havia uma surpresa: a comemoração do aniversário de Benedito. O aniversário na verdade tinha sido dia 8, mas como eles não estavam em casa, Christine adiou a festa. O importante era não passar em branco.


Benedito ganhou uma bicicleta nova e algumas roupas. Eu dei um par de havaianas para cada um dos meninos. Acho que foi nesse momento que passei a existir dentro de casa. Eheheheh.

Fomos todos passear de bicicleta. Saboor, que por sete meses vai permanecer com um imobilizador na perna e por isso não pode andar, foi num carrinho atado na bicicleta da Christine. Passamos no local onde a nova casa vai ser construída e, depois de muitas voltas, fizemos uma pausa na casa dos avôs dos meninos. A foto em que estou sozinho na bicicleta foi tirada por Benedito.


Sábado de tarde, fui com Iládio e Benedito na piscina. Eu fiz natação por cinco anos, sei nadar razoavelmente bem, mas a Christine pediu para a moça que cuida das crianças na piscina me aplicar um teste. Em resumo: nadar crawl, peito e costas; nadar carregando um outro menino, simulando uma situação de afogamento; nadar 50m sem parar; pegar um objeto no fundo da piscina; e pular do trampolim. Bem, passei no teste, mas fiquei imprestável na meia hora seguinte, de tão cansado. É, os anos estão começando a pesar… Ehehehe.


À noite, a Christine me disse que todos iriam no teatro e me perguntou se eu queria ir junto. Pensei: não vou entender nada… em todo caso, gosto de teatro. Era uma peça infantil, mas igual! Decidi ir. Qual foi minha surpresa ao chegar lá e ver a envergadura da coisa. Tratava-se de um teatro para, chutando, umas duas mil pessoas, encravado no meio da floresta. Isso mesmo, no meio da floresta! O cenário foi montado entre as árvores, e os atores interpretavam na terra mesmo. Só o público ficava protegido por uma abóbada. A peça era sobre uma das histórias da personagem Pipi Lange Strümpfe (Pipi Meias Compridas), muito conhecida por aqui. Não entendi quase nada, mas gostei.

Dias depois, passei por outro teste na Alemanha: praticamente uma nova prova de auto-escola. Tenho a minha carteira desde agosto de 2005 e possuo a licença internacional para dirigir. Há, porém, diferenças no trânsito de cada país, e a Christine colocou um professor de auto-escola para andar comigo. Acho que ficamos mais ou menos duas horas rodando para lá e para cá, aprendendo a entender as placas indicando a velocidade permitida em cada via, des-automatizando o gesto de não parar quando vemos uma bicicleta (aqui são elas que têm preferência em quase todas as ruas) e treinando entradas e saídas em vias expressas. Esse ultimo treinamento é mais importante: na Alemanha existem vias (Autobahn) em que se pode andar até a 200km/h, então é necessário saber bem como funciona. Passei nesse teste e pude pegar o carro da família algums vezes depois disso.

Na quinta-feira seguinte à chegada de Iládio e Benedito, começaram as aulas. Para Saboor, porém, o primeiro dia foi só no sábado, seu primeiro dia na escola. Aqui faz-se uma festa para receber as crianças, e eu pude acompanhar dessa vez. Os pequenos ganham um presente e são recebidas com música. É curioso: o primeiro na escola, que geralmente é traumático, aqui passa normalmente. Ninguém chora.


Até agora, contei como foi a viagem do Brasil até aqui, os dois dias em Amsterdam, os primeiros dias na Alemanha e a primeira semana com a família completa. A partir dos próximos posts, não preciso mais contar na ordem. Vou registrar aqui impressões e comentários conforme me ocorrem.